A Mulher Louca Por Fumo
A Mulher Louca Por Fumo

Nem todas as histórias que nossos avós contam são lendas...

Gostaria de começar a contar o que me aconteceu como se fosse apenas uma daquelas histórias passadas em gerações para espalhar folclores e lendas. Eu gostaria muito, mas não foi bem assim. Ficaria feliz no final de tudo se pudesse dar risadas e dizer o quanto essas fábulas antigas são patéticas.

Todas as férias que lembrava ter vivenciado, passei no Rio de Janeiro. Nada de diferente. Eu e mamãe apenas passeávamos nos shoppings, assistíamos filmes e voltávamos para casa. Eu tinha mais tempo para brincar com as amigas do prédio e só, nada de diferente.

Mas em um certo verão papai ligou para a minha casa, eu tinha dez anos na época, alegando ótimas notícias para nós dois: férias com os avós paternos. Meu pai e minha mãe se separaram ainda quando eu estava no jardim de infância, desde então, eu tenho duas casas e passava férias intercaladas com os dois. Como era a vez de papai, ele decidiu irmos até o encontro dos meus avós, no Pará. Seria a primeira vez que eu viajaria de avião.

Chegando lá, podemos nos aconchegar em um maravilhoso sítio, cheio de grama e muitos bosques o cercando. Haviam vacas; ovelhas; galinhas; patos; porcos; cavalos etc. Tinha um rio que passava por trás do sítio também. Lá eu pude descobrir que no céu tem muito mais estrelas que poderia imaginar, umas dez mil vezes a mais das que eu via na cidade.

Para a minha surpresa meus primos também estavam passando as férias lá, era um lugar singelo, barrento e calmo. Eu gostava disso. Vovó fazia bolinhos de chuva acompanhados de café com leite e sempre podíamos andar a cavalo, alimentar os bichos e correr até quando enxergássemos o casarão bem distante.

O dia raiou e comemos nosso café da manhã reforçado, vovó; vovô e papai haviam saído para a cidade que não ficava tão distante, nos deixando com tudo que precisávamos. Mas algo estranho aconteceu.

Na estrada de barro um velha se aproximava, com roupas negras de trapos. Seus cabelos esbranquiçados e um rosto abarrotados de rugas, lembrava muito uma bruxa, mas ao se aproximar vimos que não era nada daquilo.

"Meus filhos, bom dia, ajudem essa pobre velha. Vocês têm leite?".

Um primo mais velho se aproximou e a ajudou. Lhe oferecemos a cadeira de balanço do vovô e ela se assentou. Demos leite e ela disse algo como precisar alimentar um bebê, -que estranho.

"Vocês por acaso teriam fumo?".

Nosso avô fumava às vezes, mas dissemos que não. Ela ficou brava e insistia, queria porquê queria fumo, mas nós não demos. Ela falou algumas palavras emboladas, não entendemos nada. Nosso primo foi firme na decisão e disse que não lhe daria fumo algum e que ele poderia ajudá-la a voltar pelo mesmo caminho que havia chegado, e assim ela fez. Emburrada e falando na língua que apenas ela entendia. Antes de ir disse: "Quem quer? Quem quer?", e sorriu. Nossa prima, Diana, se atreveu a falar: "Quer o que? Eu quero!" zombando da velha, certamente aquela mulher era maluca. A velha mudou de feição novamente, com os olhos vidrados ao horizonte. Virou-se e foi embora.
Decidimos não contar a ninguém sobre a vinda daquela velha ao sítio, foi uma situação muito estranha, os adultos não precisavam saber e além do mais não sentiriam falta do leite.

Logo depois do almoço, vovó; vovô e papai tiraram uma soneca e fomos para o imenso quintal brincar. Fizemos tudo que podíamos, rimos dos patos correndo e das estrelinhas mal feitas pelos primos mais novos. Foi quando vimos a silhueta ao longe da velha outra vez, ficamos assustados, mas corremos para falar com ela. Em vão. Ela já não estava mais lá, talvez por ninguém tê-la atendido. Subimos as escadas para chegar a varanda quando quase demos um pulo. Era horrível, assustador, a pior coisa que já tínhamos visto. Em nossa porta havia um bebê, um bebê morto. Uma pequena criança em decomposição. Gritamos muito e fomos acordar os adultos. Falávamos um tropeçando no outro, quase sem respirar. Quando eles foram procurar a criança, não havia mais nada. Eles acharam que estávamos inventando coisas, para os adultos, nós sempre inventamos coisas. Ficamos chocados o resto do dia, não queríamos nem brincar mais.

Era tudo estranho. Muito estranho!

Naquela noite, todos deitamos no chão da sala e vovô começou a contar uma daquelas histórias assustadoras (para piorar tudo) que fariam com que aquela cambada de criança corresse para a cama.
"Já ouviram falar de Matinta Perera? Pois eu vou contar a história dessa bela moça que não teve um fim tão belo..." ele começou e logo ficamos atentos. "Matinta Perera era uma jovem formosa que morava em um casebre no interior, adorável mulher. Apesar de sua beleza, não encontrou um marido que a amasse e os anos se passavam depressa, sendo assim seu pai a casou com um filho de um fazendeiro. O homem era grosso e ciumento, pobre Matinta... Certo dia, depois de casados e a bela jovem esperando um bebê, seu marido chegou em casa furioso. Brigava pelo fato de Matinta gostar de tabaco, de atrasar a comida ou de ver outros rapazes a olhando, -como se ele tivesse culpa. Eles brigaram fervorosamente naquele dia e algo terrível aconteceu. Seu marido deu-lhe muitas facadas, acertando seu menino também. Mas forças distintas, além de nossa compreensão não permitiram a morte da jovem mãe e lançaram uma maldição: transformando-a em um velha grotesca de dia e um pássaro agoureiro à noite. Por isso se escutarem um piado diferente, é Matinta lhe observando, pronta para passar a maldição para você."

Todas as crianças ficaram pensativas, inclusive eu, e depois fomos dormir num silêncio profundo. Ficamos amedrontadas, apesar de sabermos que eram só histórias, o que presenciamos foi diferente de tudo. Nós sabíamos que aquele bebê era real.

Antes que caíssemos no sono, com nosso quarto iluminado apenas pela Lua, mais um fenômeno estranho. Ouvimos um piado de um pássaro diferente. Nossos corações saltaram pela boca, alguns se mijaram de terror.

"Onde está Diana?", percebemos que ali ela não dormia. Procuramos por toda a casa, sem acordar os outros, pois sabíamos que eles achariam que seria imaginação nossa. Mas nada.

Nossa prima havia sumido.

Dias depois eu estava em casa, ainda muito assustada. Jamais queria voltar para aquele lugar.

Diana jamais fora vista outra vez.

Nem todas as histórias que seus avós lhe contam são apenas mitos...

Conto de terror enviado por Darlen Garcia.